segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

     Tínhamos exatos cinco anos quando nos conhecemos, mas tenho certeza de que posso lembrar como se tivesse ocorrido semana passada. Minha mãe sempre adorou dar suas caminhadas pela vizinhança e apesar de falar meio alto (acho que isso é coisa de gringo), sempre teve uma boa relação com as pessoas próximas de onde morávamos. Eu, como filho adorável, resolvi acompanhá-la até o mercadinho onde comprávamos leite e pão, além da famosa torta de morango com cobertura de chocolate, a qual sempre levava um pedaço pra casa. Mas esse dia não foi como os outros, onde entrávamos, saíamos e o máximo de emoção que tínhamos era quando eu chorava para conseguir a minha torta. Dessa vez você estava lá, branca feito uma das caixas de leite que havíamos comprado, mas a diferença estava estampada na minha cara, eu nunca havia visto uma caixa de leite tão perfeita. Pena que não tive muito tempo de lhe admirar, logo você foi embora com sua avó, empunhando um daqueles pirulitos maiores do que sua própria cabeça, pulando como se tivesse encontrado o tesouro mais incrível do universo. Posso apostar que minha mãe me chamou umas três vezes para escolher meu pedaço de torta, enquanto eu lhe via saindo pela porta, com aquele vestidinho rosa e uma fita amarrada no cabelo. Eu bem que queria dizer: ‘Ei, quer uma bala?’, ainda bem que não o fiz, assim quase tive uma overdose deliciosa de açúcar com aquelas balas de banana e, logo que percorremos meia quadra, minha mãe falou: ‘Quer ficar gordinho? Olha que ela não vai gostar...’ e então tive a certeza de que tinha feito besteira, porque afinal, ele merecia um homem bonito, ela era linda. Fiquei corado por alguns instantes, pois tinha convicção, não era com minha mãe que eu deveria ter aquela conversa, eu nem ao menos sabia o que era aquilo, o que tinha contecido ou o que eu estava sentindo. Como uma criança que se preze, cerca de duas horas após comer a minha torta, fui brincar na rua (aliás, tenho que dizer que essa foi a parte mais divertida e importante da minha juventude, aprendi muita coisa com meus amigos e as situações em que nos metíamos). Lá, encontrei meu amigo jogando futebol com outro garoto, na frente de uma das garagens dos vizinhos, onde dava pra fazer perfeitamente duas goleirinhas. O jogo estava um tanto desparelho, com o placar de 15x2, um acaso normal, visto que um deles não estava dotado da capacidade de correr, talvez devido a sua infância caseira e monótona, onde não teve a oportunidade de fazer coisas corriqueiras de criança, somente após sua mãe ter sido hospitalizada e ele, ficado sob o cuidado do avô. Já o outro garoto, o desconhecido, tinha fome de bola e jogava como poucos na rua, provavelmente teria tido sucesso em um time grande, longe dos arredores de uma cidadezinha perdida no meio do Rio Grande. Fiquei observando, já que ambos eram mais velhos e eu, provavelmente tomaria o mesmo placar em questão de minutos, fosse com um ou contra outro. Eis que você aparece, descendo as escadas ao lado da garagem, com aquele mesmo pirulito, mas dessa vez, ele já não tinha o tamanho da sua mão. Dessa vez, não tínhamos a menor chance de nos conhecer, já que eu não tinha balas e você não estava tão feliz quanto ao ganhar seu enorme presente. Como num momento abrupto, sinto uma bolada no meu rosto, nossa, como aquilo doeu. Com o passar dos segundos, a marca foi pegando fogo, porém não podia chorar, você me fitava com aqueles olhos verdes, sua boca ainda entreaberta, demonstrando mais susto e surpresa com aquela bolada do que eu mesmo havia sentido. Pouco tempo depois, a única coisa que eu ouvia eram gargalhadas do meu ‘amigo’ e do outro garoto, tirando sarro e dizendo coisas do tipo: ‘Está vendo, nisso que dá ficar de queixo caído por uma menina!’, Santo Deus, eu nem sabia o que isso significava, até conferi para ver se meu queixo ainda estava intacto, sim, ele estava lá, ainda bem, aí sim eu iria chorar. Não entendi como e até hoje não entendo porque, mas você pegou na minha mão e me levou escada acima, até uma árvore no terreno atrás daquela casa, pareciam limões ou laranjas verdes, eu não sabia ao certo, pensei: ‘Será que ela vai me jogar isso na cara e rir de mim também?’. Você correu até a casa e voltou com um balde, começou a catar limões do chão e foi o enchendo, mesmo sem saber o motivo, resolvi ajudar, achei que fossemos fazer uma limonada ou algo assim, ‘Que jeito estranho de conhecer uma pessoa.’, pensei. Quando estava quase cheio, você tentou carregar o balde, mas não conseguia, era muito pequena e não tinha forças pra isso. Demonstrando que duas cabeças pensam melhor do que uma, resolvemos colocar isso a prova somando a força de duas pessoas juntas, mas éramos muito ingenuos e acabamos por esvaziar quase meio balde. Chegamos até a parte de cima da garagem, aquelas feitas separadas das casas, como se fosse um retângulo e colocamos o balde no chão. Então você me olhou novamente, sorriu, olhou para os limões, para mim novamente e então começamos a atirar aquelas coisas nos garotos, alguns até os acertaram em cheio porém sabíamos que aquilo não tinha mais volta, precisávamos correr, e rápido. Não sabia para onde ir, então comecei a lhe seguir em meio aquelas árvores gigantescas no quintal daquela casa, ‘Seriam os donos seus tios?’, pensei comigo. Você, impressionantemente, estava se distanciando de mim e quando mais eu pensava, mais acabava ficando para trás. Chegamos a saída, no outro lado da quadra, você olhou para se certificar de que eu estava ali e continuou correndo até uma dessas casinhas de menina, do outro lado da rua. Logo que entramos, você me pediu para ficar quieto, com aquele velho gesto de ‘cala a boca’ e então eu percebi que aquilo era inútil, não havíamos trocado duas palavras até então, eram somente gestos e olhares insinuantes, por que eu deveria ficar quieto? Estávamos apavorados, tremendo dentro daquela casinha de madeira, devia estar fazendo uns 10 graus naquele dia e você estava de vestido, pensei: ‘Que mãe é essa? A minha me obrigou a sair com dois blusões!’. Suas primeiras palavras foram: ‘Está doendo?’, respondi: ‘Um pouco.’ E, logo depois disso, você se aproximou, me deu um beijo na bochecha e disse: ‘Minha mãe sempre diz que um beijinho cura a dor.’ Precisei me aproximar, entreguei um de meus blusões e então disse: ‘Você precisa se esquentar, está ficando frio.’ Eu parecia meu pai falando, uma vez tinha visto ele fazer isso com a minha mãe, ele havia ganho um beijo como recompensa, eu estava esperando o meu segundo beijo. Eu ainda estou...

Ps: talvez um dos textos mais idiotas aqui já postados.

Por Vinícius Fin.

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